05 maio 2006

A triste escolha


Chorando em seu leito, Joana dava vazão a tristeza. Parecia que haviam se passado séculos, desde que se decidira por esse ato que agora lhe enojava. Ainda podia sentir as dores lancinantes. Era como se um fogo abrasador queimasse suas entranhas, e de certa forma era isso mesmo que acontecia. Mas agora, o fogo do arrependimento era pior.
Na sua cabeça fervilhavam perguntas sem respostas. Porque fora se envolver daquela forma? Como não tinha se precavido, evitado aquela gravidez indesejada? Porque descera tanto a ponto de tirar a vida de um ser inocente?
A memória, essa companheira cruel em alguns momentos, insistia em reprisar todo o filme em sua cabeça. Conhecera Rogério em uma festa. Rapaz bonito, falante. Rapidamente entraram numa comunhão de idéias e pensamentos. Em poucos dias eram inseparáveis. Ambos já eram experientes em assuntos da sexualidade e se permitiam usufruir momentos de intimidade cúmplice, recheados de carinhos, palavras sussurradas em meio a promessas de validade duvidosa.
Joana usava pílula anticoncepcional há anos, mas relembrando agora os fatos ocorridos, parecia que inconscientemente ela queria mesmo aquele filho, pois esquecia o medicamento e fingia não ver que sempre sobravam mais comprimidos do que dias na agenda. Quando percebeu que podia estar grávida, o que foi confirmado pela coloração azul do teste da farmácia, se sentiu invadida por um misto de alegria e receio. Era evidente que gostava de Rogério, mas qual seria a resposta dele. Do choque inicial, ele passou a promessas de união eterna, que foram pra ela como um bálsamo, mas no outro dia, e em todos os outros ele simplesmente nunca mais voltou.
Odiando aquele ser que tinha tirado de sua vida sua maior paixão, e a atrapalhava a sair, pois os enjôos eram freqüentes, ela decide tomar a pílula abortiva, porém pelo tamanho adiantado do feto, entra em um processo de cólicas intensas, sem conseguir expulsar o filho, acabando na mão um médico inescrupuloso que realiza o assassinato a peso de ouro, não trinta moedas, mas milhares delas. Agora estava em casa, e sangrando, enfraquecida, com vergonha de contar a mãe o ocorrido, entra num torpor, causado pela queda de pressão, acordando dias após na UTI de um hospital da cidade.
O que aconteceu naquele meio tempo, foi tão real, que não pode duvidar. Ela se via saindo do corpo, com uma roupa diferente, caminhando por um corredor imenso, uma espécie de Hospital. De repente sente-se atraída para um quarto, onde repousa o corpo de uma criança adormecida. Ao lado do bebê, a vozinha desencarnada a tantos anos. Espantada por se encontrar com a avó, o primeiro pensamento é que tinha também morrido. A avó se levanta, indo ao seu encontro, abraçando-a com ternura. Ah, sensação maravilhosa! Necessitada de apoio e compreensão, desabafa com a avó, deixando que toda a tristeza represada naqueles dias sejam expelidas como um fel amargo.
Esperando que a neta colocasse pra fora toda aquela energia negativa, mostra a ela a criança, aquela que ela acabara de impedir que nascesse.
- Filha do meu coração, acalma teu espírito! A misericórdia divina é infinita e nos espera sempre.
- Mas vó, então é verdade que o feto já carrega a vida?
- Joana, o espírito eterno que iria reencarnar como seu filho já se encontrava ao seu lado há vários meses, se ambientando energeticamente, se preparando para mais uma prova no abençoado planeta Terra.
- Mas como isso é possível?
- Filha querida, a vida é sempre contínua, não há intervalos. Nascemos e desencarnamos centena de vezes em busca da perfeição. No plano divino não há acasos. Tudo segue uma programação amorosa, então é mais que natural que os futuros filhos procurem, quando possível, conhecer as futuras mães, e conviver com elas algum tempo, se ambientando em seus futuros lares.
- Mas o que será dele agora?
- Esse nosso irmão que viria como seu filho, na verdade não iria viver mais do que alguns dias. Nasceria com um problema genético grave, resgatando assim débitos passados que todos carregamos em nosso psiquismo. Necessita agora de repouso e isolamento, a fim de se preparar para novos embates. Você foi trazida aqui para entender esse processo, pois os seus pensamentos de culpa e desespero não o deixam se desligar da hora fatídica do aborto. Pense um pouco filha, eleve seus pensamentos a Deus e peça forças para uma nova oportunidade no futuro. Tente conversar com esse irmão de forma sincera e amorosa, dizendo a ele o quanto você sente, mas permitindo que ele possa seguir em frente sem ser atingido por seus pensamentos tumultuados.
Animada pela energia amorosa da avó, Joana se ajoelha ao lado da cama, e eleva sinceramente seus pensamentos a Deus. Há quanto tempo não fazia isso? Nem se lembra. Era incrível que após tudo que fizera ainda continuava a atrapalhar a recuperação daquele ser que só pedia uma chance. E ela negou. Envolvida pelo mais sincero desejo de encerrar aquela fase em sua vida, conseguiu se concentrar e com a ajuda da avó, cortar os laços energéticos que prejudicavam o feto, mudando o curso de seus pensamentos.
Encerrada a prece, viu a avó se afastar aos poucos, ir sumindo, era como uma queda. Voltava ao corpo físico. A visita ao plano espiritual permaneceu viva em sua mente por muitos dias, até a sua plena recuperação.
Não poderia voltar atrás no que fizera, mas sua vida nunca mais seria a mesma. De todas as formas evitaria optar novamente por aquela triste escolha.

Um comentário:

Anônimo disse...

BOM DIA SÉRGIO!
Muito esclarecedor este artigo.
Lamentavelmente isto ocorre com muita frequência principalmente por falta de boas orientações.Artigos como este deveriam ser publicados
em escolas e ao público em geral
PARABÉNS!
WÃNIA
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